Era a casa e tudo o que a casa era. As paredes caiadas e a cal e os panos que a enfeitavam, na verdade, os panos que enfeitavam a casa que nos enfeitava os dias. E as noites acesas pelas luzes da casa, as paredes. A casa e os quadros às janelas. As janelas de cima com quadros verdes e azuis de céu, as janelas de baixo com os girassóis a fazer de vizinhos. A escada de barro e cera. E o corrimão da escada, a ferro, forte, verde pinheiro, manso. A casa era portuguesa de portugueses que andaram pelo mundo, por isso, a casa era portuguesa com sinais dos portugueses pelo mundo. A casa é uma expressão bonita. Esta expressão da casa é quente porque assim o era a casa, um calorífero. Nunca esqueceremos os dias a pintar e a tirar as danadas das ervas. Fizemos sempre questão de não retirar todas as danadas, para uma presença simbólica. Ateus politeístas, não cultivámos os objectos, mas amámos cada um. Podia contar-vos tantas histórias do passado desta casa, tantas! Agora, há momentos, olhei as paredes (depois de ter desligado a luz, estou prestes a subir) e imaginei, noutro pretérito, como será quando eu for passado nesta casa.
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