the final countdown
ai
desoras [a cabra]
Hoje ouvi o sino daquela torre pela primeira vez
É aquela torre que todos daqui devem saber como se chama e porquê
Eu não sei
Nunca perguntei
Pois, hoje ouvi o sino daquela torre pela primeira vez
Mantenho o desejo de que o seu relógio não saiba as horas e de que ninguém as adivinhe
farrapo
stillness please said the individual
once [again] a time
I am reaasured. I am reassured.
These are the clear bright colours of the nursery,
The talking ducks, the happy lambs.
I am simple again. I believe in miracles.
I do not believe in those terrible children
Who injure my sleep with their white eyes, their fingerless hands.
They are not mine. They do not belong to me.
Sylvia Plath
aniversário
breathing, walking & burning
de Trail of tears, Delilah Montoya
wandering & climbing
photo: Scott Ferguson
Eu ando pelo mundo prestando atenção
Em cores que eu não sei o nome
Cores de Almodóvar
Cores de Frida Khalo, cores
Passeio pelo escuro
Eu presto muita atenção no que meu irmão ouve
E como uma segunda pele, um calo, uma casca,
Uma cápsula protetora
Há, eu quero chegar antes
Pra sinalizar o estar de cada coisa
Filtrar seus graus
Eu ando pelo mundo divertindo gente
Chorando ao telefone
E vendo doer a fome, nos meninos que têm fome
Pela janela do quarto
Pela janela do carro
Pela tela, pela janela
Quem é ela, quem é ela?
Eu vejo tudo enquadrado
Remoto controle
Eu ando pelo mundo
E os automóveis correm para quê?
As crianças correm para onde?
Transito entre dois lados
De uma lado eu gosto de opostos
Esponho o meu modo, me mostro
Eu canto para quem?
Eu ando pelo mundo e meus amigos, cadê?
Minha alegria, meu cansaço?
Meu amor, cadê você?
Eu acordei
Não tem ninguém, ao lado!
Esquadros, Adriana Calcanhoto
solstício
quem vai olhar, olhos nos olhos?
burguesinha
ele há gente muito mázinha
presente do indicativo
trilogias
nem é silêncio
Obrigada, Eugénio, obrigada!
Não sei quem, nem em que lugar,
mas alguém me deve ter morrido.
Senti essa morte num arrepio da tarde.
Qualquer amigo, um dos vários
que não conheço e só a poesia
sustenta. Talvez a morte fosse
outra: um pequeno réptil
no sol súbito e quente de Março
esmagado por pancada certeira;
um cão atropelado por um bruto
que, ao volante, se julga um deus
de arrabalde, com sucesso garantido
junto de três ou quatro putas de turno.
Talvez a de uma estrela, porque também
elas morrem, também elas morrem.
Ao longe pressentida
mas discreta.
A quem procura
entregas-te aberta.
Tinha os olhos abertos mas não via.
O corpo todo era a saudade
de alguém que o modelara e não sabia
que o tocara de Maio e claridade.
Parava o seu gesto onde pára tudo:
no limiar das coisas por saber
- e ficara surdo e cego e mudo
para que tudo fosse grave no seu ser.
*
Algumas Reflexões sobre a Mulher
Elas são as mães:
rompem do inferno, furam a treva,
arrastando
os seus mantos na poeira das estrelas.
Animais sonâmbulos,
dormem nos rios, na raiz do pão.
Na vulva sombria
é onde fazem o lume:
ali têm casa.
Em segredo, escondem
o latir lancinante dos seus cães.
Nos olhos, o relâmpago
negro do frio.
Longamente bebem
o silêncio
nas próprias mãos.
O olhar
desafia as aves:
o seu voo é mais fundo.
Sobre si se debruçam
a escutar
os passos do crepúsculo.
despem-se ao espelho
para entrarem
nas águas da sombra.
É quando dançam que todos os caminhos
levam ao mar.
São elas que fabricam o mel,
o aroma do luar,
o branco da rosa.
Quando o galo canta,
desprendem-se
para serem orvalho.
O sorriso
é para a criança
que pressentem nas fontes.
Só elas conhecem
a morte
pelo cheiro da sombra.
*
Deve haver um lugar onde um braço
e outro braço sejam mais que dois braços,
um ardor de folhas mordidas pela chuva,
a manhã perto nem que seja de rastos.
*
Balança
No prato da balança um verso basta
para pesar no outro a minha vida.
*
Arte de Navegar
Vê como o Verão
subitamente
se faz água no teu peito,
e a noite se faz barco,
e minha mão marinheiro.
*
Os Trabalhos da Mão
Começo a dar-me conta: a mão
que escreve os versos
envelheceu. deixou de amar a areias
da dunas, as tardes de chuva
miúda, o orvalho matinal
dos cardos. Prefere agora as sílabas
da sua aflição.
Sempre trabalhou mais que sua irmã,
um pouco mimada, um pouco
preguiçosa, mais bonita.
A si coube sempre
a tarefa mais dura: semear, colher,
coser, esfregar. Mas também
acariciar, é certo. A exigência,
o rigor, acabaram por fatigá-la.
O fim não pode tardar: oxalá
tenha em conta a sua nobreza.
*
Memória dos Dias
Vais e vens na memória dos dias
onde o amor
cerciu a casa de luz matutina.
Às vezes sabíamos de ti pelo aroma
das glicínias escorrendo no muro,
outras pelo rumor do verão rente
ao oiro velho dos plátanos.
Vais e vens. E quando regressas
é o teu cão o primeiro a sabê-lo.
Ao ouvi-lo latir, sabíamos que contigo
também o amor chegara a casa.
*
Improviso na Madrugada
Húmido de beijos e de lágrimas,
ardor da terra com sabor a mar,
o teu corpo perdia-se no meu.
(vontade de ser barco ou de cantar.)
Eugénio de Andrade, 1923-2005
mas que treta é esta?!
acontece que...
só vemos uma parte de verdade? - perguntou o menino
Yi-yi, filme de Edward Yang
as coisas que deixamos passar...
UPCOMING EVENTS:
Antony and the Johnsons European Tour
29 May 2005 Porto Casa da Música
30 May 2005 Famalicao Casa das Artes
31 May 2005 Lisboa Aula Magna
June Nights in Toronto with Current 93
4 June 2005 Six Organs of Admittance, Antony, Current 93
tudo, só quanto baste
benzina
algodão
amnésia selectiva, dose elevada, bem orientada
música
uma lima
um plástico qualquer, ou um saco da fnac
verniz, vermelho q.b.
criatividade e fetichismo, q.b.
preparação:
foto de dolphin.s